Hoje, mais do que nunca, a violência tem imperado em todos os espaços sociais, fruto de uma política capitalista de desigualdade e injustiça social que gera um ambiente fértil para expansão da animosidade, ódio, desrespeito e violência entre as pessoas.
A violência no dia a dia ganhou novas formas de manifestação com a questão da expansão tecnológica, tornando-se extremamente cruel na sua prática virtual, cujos sujeitos praticantes, muitas vezes ocultos (perfis falsos "fake"),fazem desse espaço o local perfeito para destilar toda crueldade, ódio e baixeza que impera em sua vida pessoal disseminando mentiras, terror e medo às pessoas.
Entender o papel da tecnologia enquanto ferramenta utilizada pelo mercado na intenção de quebrar vínculos sócio emocionais, talvez nos responda parte desse questionamento referente ao aumento da violência nas escolas.
Desde a mais tenra idade, nossos alunos e alunas já estão expostos a altas horas diante da tv, das redes sociais e da internet. Guerra, discriminação, opressão, individualismo, meritocracia, tudo isso faz parte do universo dos jogos virtuais que são a eles ofertados. Não bastasse, fake news, discursos do ódio, disseminação de padrões de beleza, banalização do sexo e da vida, incentivo ao consumo em qualquer das instâncias da vida humana e instantaneidade das relações afetivas marcadas pelo rompimento da realidade,de modo que a conectividade em tempo real não exija mais a proximidade física, influenciando no juízo de valor que está sendo criado por essas crianças e jovens, bem como por todos e todas nós.
A tecnologia trouxe a possibilidade da irrealidade vivida por meio do mundo virtual segmentando indivíduos em bolhas. As redes sociais virtuais vendem que é possível encontrar sua bolha e construir seu próprio perfil, a fim de permanecer protegido do mundo e livre da responsabilidade de constituir vínculos, tomar decisões, ser responsável por seus atos, ter a chance de errar e encontrar estratégias para auto superação.
As bolhas/casulos virtuais, que veladamente segregam pessoas, promoveram o distanciamento da realidade e a quebra da solidariedade coletiva, numa clara intenção de mercadorizar as relações humanas, disseminar conteúdos segundo interesses escusos e romper com a consciência de coletividade e comunidade. Não é a toa que a tecnologia é desenvolvida para o mercado da guerra e posteriormente incorporada como solução para o uso cotidiano.
Essas relações insólitas promovidas pela falta de vínculos são comuns em uma “cultura consumista como a nossa, que favorece o produto pronto para uso imediato, o prazer passageiro, a satisfação instantânea, resultados que não sejam esforços prolongados, receitas testadas, garantias total e devolução do dinheiro.”, Bauman (2004, p. 21-22), porque a instabilidade e a velocidade não deixam tempo para a reflexão e criticidade.
Se, como Marx, tomarmos por base que o homem (o humano) é um ser social e é por meio da socialidade na interatividade social que ele/ela se humaniza, já é possível suspeitar de uma proposição de relação social que enclausura indivíduos numa realidade não concreta.
Pois bem, voltado ao ambiente escolar, essas relações também estão postas e não respondem às expectativas de nossos estudantes, dos trabalhadores e trabalhadoras da educação, das famílias, assim como de todos e todas que fazem parte da comunidade escolar.
Nesse sentido, a liquidez das relações virtuais promoveram o descarte da pessoa humana, num clique é bloqueado tudo aquilo que é incômodo na relação com o outro. Em suma, em um mundo de faz-de-conta cada um cria seu próprio perfil: adolescentes transformam-se em modelos bombados e esteriotipados, reproduzem todo o discurso machista e os padrões de beleza que o mercado precisa comercializar. Assim, pedófilos tornam-se “amigos” oportunistas da infância e, a violência banalizada é estampada como mercadoria nas manchetes das redes sociais e nos programas televisivos, onde “bandido bom é bandido morto”. No entanto, nunca há o questionamento quanto ao histórico para a formação desse “bandido” e quais as esferas de poder se beneficiam com a manutenção da bandidagem, das milícias e do crime organizado.
Dessa forma, propor abordagens solidárias no ambiente escolar e em nossas relações cotidianas, resgatando a proximidade real com nossos familiares, companheiros de trabalho, estudantes e famílias, talvez seja um caminho para romper com a solidão inerente ao mundo virtual e a falta de expectativa num futuro promissor que tende a gerar frustração e violência.
Buscar prazer nas pequenas coisas que promovam vínculos reais ao invés de impulsos consumistas também é de grande valor: tomar as ruas para brincar, compartilhar da comida num picnic coletivo durante visita no parque, expressar sentimento junto às pessoas que amamos e que nos são importantes, jogar conversa fora, dizer bom dia aos transeuntes, promover a escuta ativa e a capacidade da amorosidade e da esperança esperançosa como ensinou Paulo Freire também é de grande valia na intenção de tecer relações emocionais duradouras.
A violência cotidiana que está presente no espaço escolar necessita de ações que envolvam a tod@s, entendemos que uma ação essencial é a prática democrática que necessita do envolvimento de toda comunidade escolar com os colegiados fortes e atuantes: conselho de escola, associação de pais e mestres e grêmio estudantil para que viabilizem ações de solidariedade, ações de conscientização e práticas coletivas para barrar a proliferação do medo e desarticulação da cultura violência, bem como um olhar sensível por parte dos profissionais da Educação, ao serem confrontados em tais situações.
A comunidade escolar que cristaliza uma cultura de paz tem condições de encarar essas ações oportunistas de espalhar medo com ações que se viabilizem no projeto pedagógico escolar.
O momento que por lobby de segmentos militares atuantes nos poderes executivos e legislativos de nível federal, estadual e até nos municípios propagam suas idéias difundindo-as pelo senso comum pregando a militarização de Unidade Escolares como forma de resolver tais questões que não condizem com o real papel da escola. A escola deve ser um espaço que promova a educação plena para formação de cidadãos que entendam seus direitos e deveres e participem na construção dos mesmos, e não de ação militar para impor disciplina, vigiar a prática pedagógica.
A solidariedade deve partir dos próprios membros escolares, combaterem a cultura do ocultismo virtual com ações pedagógicas significativas, implementarem uma cultura de paz na escola que necessita e passa pelos colegiados fortes e atuantes (associação de pais e mestres, conselho de escola e grêmio estudantil) para combaterem esse "projeto de medo" que tem sido disseminado em diversas escolas. As escolas devem estar atentas, pois, essa problemática não é algo por acaso, não sejamos ingênuos, pois paira no ar muitos interesses que as escolas sejam redutos controlados para promover uma política de acriticidade do espaço de formação da consciência e pessoas humanas.
CERL - Coletivo Educadores Resiliência e Luta.(Subsede Mauá).
Novembro/2019
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